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17 de dezembro de 2010

Feira Música Brasil 2010: impressões finais

Cabruêra na Feira Música Brasil
Terminada a terceira edição da Feira Música Brasil, realizada em Belo Horizonte entre os dias 8 e 12 de dezembro, é hora de todos os grandes gênios da produção apontarem erros e sugerirem que poderiam ter feito algo muito melhor. É fato que muitas coisas deram errado e, infelizmente, provável que os defeitos da Feira superem seus pontos positivos. Entre erros de produção, falta de tempo, verba e apoio do governo de MG (cuja próxima Secretária de Cultura, dizem, será Andrea Neves, irmã do popstar ex-Governador Aécio Neves) e da Prefeitura de BH (cuja administração de Márcio Lacerda tem se destacado como uma das mais criticadas na área cultural), muitos fatores contribuiram para que a FMB 2010 não fosse assim tão espetacular como desejado.

Elza Soares, Bebel Gilberto e Otto, antes da produção cortar o som de seus microfonesPara quem não acompanhou de perto a Feira, listo abaixo algumas das principais críticas ouvidas em relação a Feira:
- Uma das maiores críticas foi em relação ao som cortado no fim do show de Otto quando o cantor dividia palco com Bebel Gilberto e Elza Soares, em participação especial não-programada (por ordem da Prefeitura, devido ao horário, pouco depois da meia-noite), e em outros shows, como o do Mestres da Guitarrada;
- Má qualidade do som em diversos shows;
- Péssima divulgação (a programação impressa só começou a circular quando a Feira já tinha começado);
- Curto tempo de show (reclamação que, do meu ponto de vista, não procede, uma vez que em eventos desse tipo é melhor dar visibilidade a mais artistas do que muito espaço para poucas bandas);
Otto em momento sobrenatural na FMB 2010- E entre os itens que talvez não tenham ficado visíveis ao público mas geraram transtornos estão o longínquo local de hospedagem dos artistas (fora de BH, o que resultou em muita dor de cabeça para vários artistas em relação a transporte e horários), as restrições na passagem de som (pouco tempo e PA, as caixas que enviam o som para a plateia, desligadas na maior parte do tempo para não atrapalhar as palestras e reuniões que aconteciam próximos ao palco da Funarte) e a falta de informações transmitidas aos participantes (durante o evento encontrei palestrantes barrados na entrada, outros que não sabiam onde iriam se apresentar e participantes da rodada de negócios que não receberam informação alguma sobre o formato da rodada, que acabou apelidade por alguns como "roubada de negócios").

Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo o diretor executivo da FMB, KK Kamoni, colocou entre suas justificativas para o fraco resultado da Feira (além da falta de verba e de tempo) a falta de mão de obra em BH. Perdão pela expressão, mas é uma das desculpas mais porcas dos últimos tempos. Basta pensar que o Conexão Vivo, evento que acontece anualmente em Belo Horizonte, tem estrutura próxima da que foi utilizada na FMB e é muito bem produzido por profissionais locais (pecando sempre apenas no ponto da divulgação). O que acredito ter acontecido é uma má escolha de profissionais para trabalhar na Feira, o que não justifica a colocação de que falta mão de obra qualificada na cidade. O que aconteceu na FMB, em parte, também é culpa de profissionais despreparados que foram selecionados para trabalhar em um evento de R$ 3 milhões.

Lucas Santanna durante seu show no Lapa Mutlshow
Para ficar claro, registro algo que aconteceu comigo durante a Feira e explica minha colocação. Trabalhei na assessoria de imprensa da FMB e uma das minhas funções era cobrir os shows realizados no Lapa Multshow (parte da programação da Feira classificada no programa "Noite adentro", unindo artistas selecionados via edital da FMB e outros convidados diretamente pela produção) e organizar a demanda de imprensa interessada em falar com os artistas na hora dos shows, nos camarins, etc. No primeiro dia, me identifiquei, expliquei minha função para as responsáveis pela produção no Lapa e disse que precisava ter acesso aos camarins para conversar com os artistas. Em resposta, ouvi um "vou ver o que posso fazer" e só depois de muito tempo (depois de explicar que estávamos trabalhando JUNTOS para o MESMO evento, bla bla bla) consegui o acesso. E o pior é que no dia seguinte foi a mesma coisa. E para piorar, até a apresentadora do evento teve que resolver um início de confusão na portaria em um dos dias de evento porque as responsáveis pela produção eram incapazes de saber o que fazer. Como se não bastasse, ainda há outro caso: pedi para liberarem a subida de uma fotógrafa profissional ao palco para fazer o registro da noite (a Feira não contratou fotógrafos para cobrir toda a sua programação, então tive que recorrer a amigos interessados em fazer algumas fotos para seus portfolios) e uma das responsáveis pela produção me disse que elas mesmas estavam fazendo o registro dos shows e me mostrou uma câmerazinha de mão que estava no seu bolso. Isso, em um evento de R$ 3 milhões tido como a maior feira de negócios musicais da América Latina, a maior ação do Governo Federal na área musical.

E já que citei o orçamento da Feira, outros números me vieram à mente: 12 e 6. 12 é a quantidade de milhares de R$ paga a cada um dos grupos que se apresentaram na Sala Juvenal Dias, no Palácio das Artes, selecionados na categoria Música de Concerto. 6 é o número de pessoas que compareceu ao primeiro show da FMB por lá. Nos dias seguintes não foi muito diferente: 23 e 28 pessoas por dia. E por falar em público, a ação da FMB na boate NaSala também não foi muito diferente, chegando a ter uma das apresentações canceladas em vista do pífio público presente.

Pode parecer um grande desastre, mas é preciso lembrar que muito coisa importante provavelmente irá surgir a partir das articulações que se iniciaram ao longo dos dias da Feira. Produtores e artistas de diversas regiões do país e do exterior se conheceram e trocaram contatos e informações, shows foram marcados ao redor do planeta, ideias diversas surgiram. Essa articulação é o ponto mais interessante da Feira e nesse sentido o evento parece ter sido bem sucedido.

"Entrevistag", produto da oficina Dispositivos Móveis e Novas Mídias realizada durante a FMB 2010

Ótimos shows aconteceram (sendo que vários deles já foram comentados no Meio Desligado), um enorme número de pessoas conheceu bandas das quais antes nunca haviam ouvido (e gostaram!), oficinas de capacitação ofereceram novas possibilidades de atuação para profissinais locais... os números referentes à Feira Música Brasil 2010 (mesmo que aparentemente inflacionados) comprovam sua, digamos, eficácia (ou ao menos legitima sua realização):
- R$ 60 milhões em negócios diretos previstos, a serem desenvolvidos ao longo do ano de 2011;
- 32 mil pessoas presentes em 99 shows;
- 30 mil pessoas atingidas via transmissão ao vivo de todos os shows, painéis e palestras;
- 3 mil bandas/artistas inscritos;
- 1 mil empresas nacionais e internacionais presentes no Encontro de Negócios;
- 2 mil pessoas acompanharam os paineis e palestras;
- 268 pessoas capacitadas em oficinas/cursos;
- 7 toneladas de alimentos não-perecíveis doados a 120 instituições filantrópicas da Região Metropolitana de Belo Horizonte, no programa Mesa Brasil SESC.

Contudo, não consigo tirar da cabeça que algo  muito errado deve estar acontecendo para que um mesmo evento gere manchetes tão distintas quanto "Feira Música Brasil termina com vaia do público em BH" e "FMB2010 encerra terceira edição com sucesso em BH!".

Ou, talvez, eu simplesmente esteja meio desligado.

Garota tresloucada em frente ao Bordello, na programação Noite Adentro da FMB

Créditos das fotos: 
1. Cabruêra por Ricky Moreno / 2 e 3. Otto por João Rafael Lopes / 4. Lucas Santanna por Ricky Moreno / 5. Gatinha mostrando a língua em frente ao Bordello, na programação Noite Adentro da FMB, por Ricky Moreno

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