Por Leo Santiago
Pouco dinheiro, muita burocracia e nenhum artista do interior na circulação do Música Minas 2010
Pouco dinheiro, muita burocracia e nenhum artista do interior na circulação do Música Minas 2010
Fruto da organização da classe musical
mineira em 2008, o Fórum da Música de Minas Gerais é uma conquista para
a música do Estado e um exemplo do que uma classe pode conseguir a
partir do momento em que suas reivindicações passam a ser feitas de
forma coletiva, através de entidades representativas e não mais
individualmente visando apenas os próprios interesses.
No primeiro semestre de 2009 foi
lançado o Programa Música Minas, a primeira e principal ação do Fórum
da Música. O programa, fruto de uma parceria entre o Fórum da Música e
a secretaria de cultura de MG contou com R$ 1,55 milhão oriundos de
recursos orçamentários do Estado para promover os editais de circulação
e de passagens, além da participação do Fórum em Feiras nacionais e
internacionais.
O sucesso da iniciativa rendeu elogios
da cena musical de outros estados e a renovação do convênio junto ao
governo estadual. No começo de 2010, no entanto, o Música Minas
enfrentou problemas burocráticos e por pouco não aconteceu. Alguns
empecilhos colocados pelo governo de MG por se tratar de ano eleitoral
quase inviabilizaram o programa, que acabou se efetuando após a classe
artística iniciar um movimento que culminou em um protesto na porta do
Palácio das Artes (BH).
Faltam recursos, sobra burocracia
A publicação do edital 2010, no
entanto, se deu com algumas modificações em relação ao ano anterior.
Primeiro, os recursos financeiros minguaram para R$ 1,1 milhão e o
edital de circulação que no primeiro ano havia contemplado 30 artistas
com passagens e cachês, em 2010 só atendeu a 10. Com o corte de 1/3 no
número de beneficiados o edital perdeu também a divisão por categorias,
que permitia uma seleção mais democrática. Em 2009 as 30 vagas eram
divididas igualmente entre artistas “renome”, “destaque” e “revelação”,
o que permitia que os músicos definissem qual era sua categoria e dessa
forma disputassem uma vaga apenas com artistas “do seu tamanho”,
tornando o processo mais justo.
Em segundo lugar, a participação da
Fundação Clóvis Salgado imposta pelo governo de Minas Gerais,
burocratizou o processo a ponto de afugentar potenciais concorrentes ao
colocar uma gama de empecilhos no processo de inscrição como, por
exemplo, a necessidade de apresentar a inscrição a partir de um CNPJ. A
incoerência de se abrir um edital para músicos e exigir dos mesmos
cadastro de pessoa jurídica é gritante. Além disso outras exigências
como a necessidade de ter carteira da OMB (uma entidade falida há anos)
ou o excesso de documentos cobrados junto à entidade da qual o músico
tomara o CNPJ emprestado são outros pontos que precisam passar por uma
reavaliação do governo, que também está sendo cobrado para
transformar o programa em lei, com garantia de realização todos os anos.
Interior fica de fora
Se por um lado a escassez de recursos
financeiros e toda a burocracia do Música Minas podem ser considerados
fatores momentâneos, a exclusão de artistas do interior vem se
mostrando uma característica intrínseca ao projeto. Em 2009 os artistas
do interior representaram pouco mais de 10% dos selecionados para a
circulação do Música Minas. Se o número já era baixo, em 2010 a
situação foi ainda pior com nenhum nome entre os selecionados.
Obviamente a seleção dos artistas é
feita por uma curadoria qualificada, com nomes reconhecidos em Minas e
no país, levando em consideração aspectos estéticos. Porém se a
secretaria de cultura do Estado de Minas Gerais tem como política
cultural a interiorização, torna-se incoerente que uma das principais
ações voltadas para a música no Estado não esteja alinhada à sua
política estadual. O resultado do edital de circulação do Programa
Música Minas 2010 revela a necessidade de se criar estratégias voltadas
para o interior para corrigir uma distorção histórica. Talvez a saída
seja a criação de cotas. Ou talvez seja necessário uma mudança no DNA
do programa, que hoje se concentra em “vender” músicos já com certo
nome no mercado para outros Estados e países.
Certo é que em um Estado tão grande,
rico culturalmente e diverso, seria interessante que as ações do Fórum
da Música se preocupassem com questões estruturais, valorizando redes,
a circulação de informações e o estabelecimento de um diálogo do setor
musical com fomento a iniciativas do interior, descentralização dos
investimentos e valorizando a diversidade da música mineira.